Técnica de enfermagem
desempregada, que mora em Lauro de Freitas, diz que precisa de 100 quilos de
ração por dia e está com dificuldades para alimentar animais.
Uma moradora da cidade de
Lauro de Freitas, na região metropolitana de Salvador, cria em casa 48 gatos e
mais de 300 cachorros, todos encontrados na rua.
"São três mil quilos de
ração por mês", diz Angêla Gomes, de 62 anos, que é formada em técnica de
enfermagem e está desempregada. [Saiba como ajudar no final da matéria]
Ela conta que começou a juntar
animais há 22 anos e já chegou a ser despejada de uma casa alugada pelo
proprietário do imóvel por conta da quantidade de bichos aglomerados.
Quem passa na frente da casa onde
ela mora com um neto, há quase 6 anos, na localidade de Areia Branca, escuta
logo os latidos, mas sequer pode imaginar a quantidade de animais no local.
“Eu
sempre gostei de cuidar de animal da rua, mas o pessoal, quando descobria,
sempre me botava para fora, me despejava, quando eu morava em Salvador. E por
isso eu resolvi vim morar aqui onde estou hoje, no interior. Aluguei esse
espaço aqui parar botar eles, ficar mais tranquila”, conta.
A maioria dos cães que tem em
casa é de raça indefinida, ou vira-latas. Os poucos de raça (12, ao todo) até
somem em meio aos demais - é possível ver um rottweiler, alguns pinschers e
outros poucos poodles. Os gatos, todos de raça indefinida, vivem em um espaço
separado para evitar brigas.
Como dona Ângela costuma
dizer, "tem cães e felinos para todos os lados": no quintal, na
varada, na sala, nos quartos e até em parte da cozinha da casa.
“Os
dois que eu coloco dentro do meu quarto são os mais debilitados, que precisam
de tratamento e de vigilância. Um é cego e outro idoso. Na sala, eu deixo eles
ficarem porque é melhor para eu observar. A minha cozinha é dividida no meio.
Do lado que eu faço comida não tem cachorro, mas do outro lado tem. Os mais
valentes eu deixo preso aqui fora”.
Ela garante que todos têm
nome. Aliás, o que não faltou foi criatividade para a escolha dos nomes: tem o
Sabotagem, o Cascudinho, Cabeção, Boquinha, Zé, Morcego, Pandora, Nundo, Ceasa,
Xerife e dezenas de outros mais.
O animal mais novo que Ângela
tem em casa tem 15 dias; o mais velho, 10 anos. "Todos aqui são de rua.
Tudo eu pego na rua. Uns com bicheira, outros atropelados, mutilados, uns
vítimas de maus-tratos. Com isso, já são 22 anos de proteção animal”, diz.
Para alimentar os bichos,
Ângela diz ser necessário 100 quilos de ração por dia e conta que tem
dificuldades para comprar tanta comida para eles todo mês.
"Eu vivo de doações.
Ganho dinheiro pedindo a um e a outro pessoalmente e na internet. Onde eu passo
eu devo ração. Devo ali, devo acolá. Eu também fiz um grupo no WhatsApp e as
pessoas me ajudam com a ração, mas não dá para o mês todo", conta.
"Eu
não gosto de ver eles com fome, por isso eu peço ajuda. Eu deixo de comprar um
remédio para mim, deixo de comprar uma fruta e vou comprar ração pra eles. Às
vezes compro fiado, outras vezes consigo dinheiro e pago”.
Ângela começou a recolher
animais da rua no final dos anos 90, quando morava no bairro de Pirajá, em
Salvador.
“Lá em Pirajá, eu comecei a
pegar os da rua, mas o pessoal descobria e pedia a casa alugada de volta. Na
última casa em que morei, no Conjunto Pirajá I, o dono se estressou, deu
porrada no portão e botou todo mundo pra fora. Nesse tempo, eu já tinha 60
cachorros. Foi aí que eu decidi vim aqui para Lauro de Freitas. Morei um tempo
de favor numa outra rua e depois achei esse espaço”, diz.
“Eu
peguei os primeiros cachorros, criei amor e sempre via outros sofrendo na rua.
Aí eu pegava e sempre botava em casa. Eu dizia que depois iria colocar na rua
de novo, mas nunca consegui me desfazer. Tentava botar para doação, mas não
conseguia doar. Então, fico com todos”.
Ângela diz que muitas pessoas
também passam hoje em frente à casa onde ela mora e abandona animais para ela
cuidar. “As pessoas são miseráveis. Deixam aqui na minha porta, jogam por cima
do muro. E foi assim que eu fui enchendo de bicho. Eu não tenho coragem de
pegar e botar na rua ou deixar aí fora amarrado. Não tenho coragem”.
A mulher diz que somente uma
vizinha já demonstrou incômodo com o barulho e até com o cheiro forte exalado
pelos animais, mas afirma que conversa com todo mundo para "poder viver em
harmonia".
"Tem
uma vizinha que reclamava às vezes do barulho de noite, mas nem tem muito
assim. Eu controlo eles. Eles dormem presos, uns soltos e também nos informam
quando vem gente estranha aqui na área. Eles latem", conta.
"Um
dia teve um assalto aí e então ela não reclamou mais porque sabem que eles
podem servir também para alertar".
A reportagem não encontrou a
vizinha de dona Ângela para que ela pudesse falar sobre o caso.
Ângela afirma que quem quiser
adotar algum dos animais pode entrar em contato com ela.
"Quando
alguém aparece para adotar, eu faço entrevista, assino um contrato de vacina,
porque não são vacinados, e pode levar. Se a pessoa não conseguir criar e
cuidar, pode me devolver que eu aceito de novo. Às vezes eles latem demais,
incomodam, e as pessoas que adotaram me devolvem", diz.
Além de ração, Ângela também
pede doação de remédios para os animais.
"Preciso
de ração, de remédio para verme, remédio para bicheira, papelão para eles
dormirem, jornal velho, toalha para dar banho neles. Tudo isso eu preciso para
o dia a dia. Mas o principal mesmo é a ração. São 3 mil quilos por mês. O
pessoal me ajuda, mas não dá para o mês inteiro. Eles começam a passar fome,
ficam estressados e machucam uns aos outros e eu fico preocupada", diz.
A moradora afirma que tem um sonho
de montar uma ONG de proteção animal para também ter apoio de órgãos públicos
para cuidar dos bichos.
“Eu
pago aluguel, pago luz, pago pessoas pra limpar a área, pra deixar limpo.
Então, eu preciso mesmo de ajuda, de doações”, diz.
Apesar das dificuldades,
Ângela afirma que quer continuar a cuidar dos animais que tem e de outros que
ainda possam aparecer.
“O
pai dos meus filhos me disse uma vez que se eu ganhasse na loteria a gente iria
viver viajando. Mas eu disse que não. Se eu estou na pobreza com meus
cachorros, eu vou continuar com eles rica também. Não desfaço deles por nada.
Tem um mesmo que está há 11 anos comigo. Então, eu crio amor. Eu sempre gostei
de animais. É amor mesmo”.
Para ajudar Dona Ângela, basta
entrar em contato por meio do telefone (71) 98812-5027, que também é número de
WhatsApp.
G1
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