Grupo da periferia de Salvador viraliza na web com vídeo de humor sobre abordagem policial: 'Já querendo dar tapa'

Vídeo foi publicado em 9 de fevereiro e já acumula quase 400 mil visualizações nas redes sociais. Em nota, PM disse que vídeo foi 'feito de maneira aleatória, jocosa, que não retrata, em nada, as técnicas e táticas utilizadas pela corporação'.

 

Um grupo de amigos baianos, intitulado de "Os cria do bairro", viralizou nas redes sociais após publicar um vídeo humorístico fazendo referência à abordagem policial em Salvador. Apesar de ter sido gravado em um tom de brincadeira, o vídeo faz uma crítica à maneira violenta que alguns dos meninos já foram abordados pela Polícia Militar (PM). [Assista vídeo acima]

"A realidade da favela é essa. [Não são todos], mas alguns policiais são assim. Na hora da abordagem, não esperam, já abordam a pessoa querendo dar tapa, mesmo sem saber se é trabalhador. Tipo eu, moro na favela, sou cantor de pagode, aí ele me para, sem perguntar, nem nada, e já chega batendo", relatou o criador do grupo, Wesley Nascimento, de 18 anos.

No vídeo, um dos meninos fica vendado, no meio do grupo, que "reproduz" como as abordagem ocorrem. Então esse garoto vendado tem que adivinhar qual grupo policial (Peto, Rondesp, Caatinga, Batalhão de Choque) estaria realizando a abordagem.

O vídeo começa com o menino do meio ajoelhado no chão e com as mãos na cabeça, enquanto outro dá um tapa e o empurra para frente, fazendo com que ele caia. O menino então responde que a abordagem estaria sendo feita pela Peto, e os demais comemoram.

Em seguida, o menino do meio aparece em pé e com as mãos na cabeça. Ele tem as duas pernas afastadas pelos amigos e o corpo inclinado para trás. O jovem então reponde que a abordagem seria da Rondesp, e mais uma vez os amigos comemoram.

Em uma terceira tentativa, os amigos fazem uma brincadeira com o menino, onde um deles coloca a axila no nariz dele, que responde "catinga" e os demais caem na risada.

Por fim, o menino aparece de joelhos novamente e com as mãos na cabeça. Os amigos começam a revistá-lo, enquanto o inclinam para trás e para frente. No entanto, ele não consegue acertar. Logo, os amigos batem nele com chinelos e o que aparenta ser pedaço de concreto, enquanto um deles grita "É a Choque, boy".

Procurada pelo G1, a PM disse, por meio de nota, que o vídeo foi "feito de maneira aleatória, jocosa, que não retrata, em nada, as técnicas e táticas utilizadas pela corporação quando aborda os cidadãos".

No entanto, entre os comentários da publicação, algumas pessoas afirmaram que esse tipo de abordagem realmente acontece. "Bem assim mesmo", comentou um seguidor.

 

Baianos viralizam nas redes sociais com vídeo sobre abordagem policial — Foto: Reprodução/Redes sociais

De acordo com Wesley, criador do grupo, o perfil na rede social foi feito com intuito de que seja uma fonte de renda futuramente, pois os meninos pretendem trabalhar como influenciadores.

"A gente criou na intenção de crescer no Instagram como influenciador e, com isso, futuramente se tornar um trabalho", explicou.

Apesar de ter o intuito de trabalhar com as redes sociais, o cantor de pagode disse que o grupo ficou surpreso com a repercussão do vídeo na internet. "A gente nem acreditou [quando viralizou]. Quando a gente postou, tinha entre 100 e 200 seguidores. No outro dia já estava com mais de mil".

Atualmente, o grupo conta com 13 integrantes. Alguns atuam como personagens e outros ficam na produção, cuidando da parte de criação de roteiro, gravação e edição do material.

"A gente vai começar a gravar para o YouTube. Um amigo da gente entrou na produção, e ele já tinha câmera, microfone, essas coisas", comentou.

Violência policial

 

Moradores registram agressão policial a jovem durante abordagem no subúrbio de Salvador — Foto: Reprodução/Redes Sociais

Em fevereiro de 2020, moradores do bairro de Paripe, no subúrbio ferroviário de Salvador, filmaram o momento de uma agressão policial durante uma abordagem da PM a um grupo de jovens. Um dos militares agrediu um rapaz com murros e chute, e fez insultos racistas ao se referir ao cabelo dele.

Já em novembro do mesmo ano, um policial militar foi flagrado agredindo com tapas e socos um motociclista, durante uma abordagem feita no bairro de Itapuã, na capital.

Outro flagrante de abordagem violenta foi feito em dezembro de 2020, onde um vídeo flagrou policiais militares agredindo um homem, que estava sentado durante a abordagem dos PMs, na cidade de Brumado, no sudoeste da Bahia.O coordenador da Rede de Observatórios da Segurança na Bahia, que é co-fundador da Iniciativa Negra e historiador, Dudu Ribeiro, observou ao longo do último ano um conjunto de indicadores de violência em cinco estados do Brasil, inclusive na Bahia. A pesquisa foi realizada pela a Iniciativa Negra, em parceria com a Rede Observatórios.

"A pesquisa, a ser lançada nos próximos meses, observa os bairros que são mais noticiados casos de violência. Não apenas de violência policial, mas de um conjunto de violências operadas, seja pelo estado ou por agentes civis", explicou.

Segundo o historiador, é importante compreender que a "distribuição de violências contra populações vulnerabilizadas é parte importante do processo de desumanização da história colonial brasileira. Ela mantém raízes importantes na formação do estado republicano e organiza as instituições da segurança pública, mas também do campo da justiça e a própria disposição do estado para com essas populações", acrescenta.

Ainda segundo Dudu Ribeiro, a população negra é o alvo dessa cultura de violência baseada no sentido de desumanização do processo colonial.

"No caso do Brasil, a população negra é o alvo dessa cultura de violência baseada no sentido de desumanização do processo colonial", salientou.

Para que essa realidade mude, o historiador ressaltou que primeiro é preciso "mudar a compreensão da segurança pública no Brasil, conseguir localizar de forma mais adequada a participação dos entes, constituir um espaço de segurança que não seja militarizado e que, de fato, promova e proteja os direitos e não seja o perpetuador das violências".

"É fundamental que a gente mude também a cultura do judiciário brasileiro, que faz parte do processo de violência distribuído pelas forças de segurança, a partir da sua atuação e, em muitos casos, também da sua omissão. Essa omissão interessada é o que faz a gente observar que é parte dessa distribuição da morte, enquanto política de estado", disse.

De acordo com o historiador, "é preciso também se deparar com cicatrizes e feridas históricas coloniais da sociedade brasileira, que reforçam estigmatização e desumanização".

"Essa é uma chave para rever, inclusive, os conceitos de justiça, substituir os processos de punição por perspectivas de reparação e responsabilização. Assim poderemos dar um passo significativo em mudanças estruturais e não paliativas como a mera formação de agentes".

Já em relação à denúncia de casos de violência policial, Dudu ressalta que "ainda falta ao estado um aparelho seguro, com condições de operar tanto no sentido da investigação, da responsabilização e da reparação, que dê confiança das pessoas acessarem serviços".

Segundo ele, "as pessoas acabam tendo dúvidas, dificuldades ou aversão ao encontro com essas instituições". Logo, "é preciso fortalecer as instituições protetoras de direitos, para que consigam oferecer bons serviços de acolhimento para pessoas vítimas de violência".

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