Rede Raia Drogasil teve de pagar R$ 56 mil de indenização à ex-funcionária Noemi Ferrari após decisão do Tribunal Regional do Trabalho. Caso aconteceu em São Caetano do Sul, na Grande São Paulo, em 2018. Em nota, a rede Raia Drogasil disse que lamenta o episódio ocorrido.
A Justiça do Trabalho condenou a rede Raia Drogasil por danos
morais sofridos pela ex-funcionária Noemi Ferrari, que denunciou ter sido alvo
de ofensas racistas em um vídeo gravado por uma colega de cargo maior em seu
primeiro dia de trabalho, em 2018, em uma farmácia em São Caetano do Sul, na
Grande São Paulo.
O caso viralizou nas redes sociais nesta semana, após Noemi
publicar a gravação. Em março deste ano, ela recebeu R$ 56 mil de indenização.
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"Essa daqui é a Noemi, nossa nova colaboradora. Fala um
oi, querida. Tá escurecendo a nossa loja? Tá escurecendo. Acabou a cota, tá?
Negrinho não entra mais", diz a agressora, enquanto ri.
O objetivo do vídeo era apresentar Noemi para os outros
funcionários no grupo do WhatsApp.
Em seguida, em tom de ironia, a funcionária passa a listar as
tarefas que deveriam ser feitas por ela no local de trabalho: "Nossa, vai
ficar no caixa? Que incrível. Vai tirar lixo? Que incrível. Paninho também,
passar no chão? Ah... E você disse sim, né?"
Ao g1, Noemi contou que, no momento das ofensas,
ficou sem reação, "anestesiada":
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"Meu pai adotivo tinha morrido, eu precisava trabalhar,
não tinha para onde correr. Fingi que nada aconteceu. Depois, fui para o
banheiro chorar. Olhei para cima e falei para Deus: 'Eu preciso trabalhar, essa
vai ser minha realidade daqui para frente", desabafou.
Após o episódio, Noemi relatou que continuou na empresa porque
entendeu que podia fazer a diferença no ambiente, tanto que foi promovida a
supervisora em 2020.
Em 2022, no entanto, ela afirmou que um supervisor a agrediu
verbalmente e quase fisicamente. "Eu falei para a gerente: 'Ou você me
recoloca em outra loja ou me manda embora'. Ela me mandou embora em
fevereiro."
Justamente a demissão impulsionou a busca por seus direitos.
"Eu não queria processar, queria esquecer essa etapa da minha vida, foi
uma fase muito ruim. Mas aí recebi uma indireta de uma funcionária, como se eu
tivesse jogado tudo para o alto a troco de nada. Esse foi o
empurrãozinho", explicou.
Decisão da Justiça
Em primeira instância, a juíza Rosa Fatorelli considerou que
o vídeo e a confissão da autoria pela funcionária comprovaram as alegações de
falas racistas. A magistrada rechaçou o argumento de
"brincadeira" ou "descontração" alegado pela defesa das rés
e fundamentou que o caso demandava análise sob a perspectiva dos conceitos de
racismo estrutural e recreativo, incompatíveis com direitos humanos e
fundamentais.
A responsabilidade da empresa foi estabelecida pela conduta
de omissão em zelar por um ambiente de trabalho adequado. Além do dano moral, a
Justiça reconheceu que a funcionária fazia turnos mais extensos do que os
registrados em ponto.
O TRT da 2ª região reiterou que o vídeo e o depoimento da
testemunha foram "vívidos e assertivos sobre a situação de constrangimento,
humilhação e assédio imposta à autora".
A tese de "brincadeira" foi novamente afastada pela
juíza Erotilde Minharro, que reiterou que o "racismo recreativo é tão
ofensivo quanto qualquer outra prática discriminatória" e que a
responsabilidade do empregador é clara, especialmente quando as ofensas vêm de
superiores.
Em nota, a rede Raia Drogasil disse que lamenta o episódio
ocorrido e que tem como propósito investir em ações concretas para garantir
ambientes de trabalho diversos e inclusivos (íntegra abaixo).
Noemi hoje
Após anos de batalha judicial, Noemi afirmou que conta com a
família e amigos para seguir em frente. Atualmente, ela é gestora na área da
saúde.
"Hoje eu estou bem, graças a Deus. Ir para a igreja, ter
uma rede de apoio, estar com pessoas que eu amo, isso tem me feito bem. Minha
psicóloga e meus advogados estão me apoiando bastante."
Animada, Noemi revelou que guardou a indenização por um
tempo, deixou o valor rendendo e deu entrada num apartamento.
O que diz a rede Raia Drogasil
Em nota, a rede Raia Drogasil disse:
"Lamentamos profundamente o episódio que ocorreu em
2018. Reiteramos o compromisso da RD Saúde com o respeito, a diversidade e a
inclusão. Nossa empresa não compactua com nenhum tipo de discriminação.
Diversidade e respeito são valores primordiais.
Temos investido de forma consistente em desenvolvimento de
carreiras e iniciativas de promoção e de equidade racial. Em 2024, encerramos o
ano com mais de 34 mil funcionários pretos e pardos e nos orgulhamos de ter
atualmente 50% das posições de liderança ocupadas por pessoas negras, resultado
direto de programas estruturados de inclusão e valorização. Nosso propósito é
continuar investindo em ações concretas para garantir ambientes de trabalho
diversos e inclusivos e contribuir para uma sociedade mais justa e
igualitária".