Ação pede recompensa de mais de R$ 13 milhões, além de indenização de R$ 150 mil por danos morais. Audiência de conciliação está marcada para o dia 18 de fevereiro.
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Antônio Pereira ficou milionário por poucas horas — Foto: Reprodução/TV Anhanguera |
Antônio Pereira do Nascimento, motorista de Palmas que ficou
conhecido após receber por engano quase R$ 132 milhões na conta, está
processando a instituição bancária que fez a transação. Ter ficado 'milionário
por um dia' trouxe consequências que, mesmo passados mais de um ano e meio,
ainda afetam o cotidiano e giram em torno de abalos emocionais e cobranças
indevidas.
O caso aconteceu em junho de 2023, quando o motorista
percebeu que sua conta tinha a quantia milionária de R$ 131.870.227,00.
Correntista do Bradesco há 25 anos, ele avisou que o total transferido para a
conta não era dele e que deveria fazer o estorno.
O Bradesco foi questionado sobre o processo e informou que
não comenta caso sub judice.
Conforme foi apurado na época, o erro foi do próprio banco,
que deveria fazer a transferência para outra instituição. Por isso, a ação pede
um pagamento e R$ 13.187.022,00 (mais de treze milhões) por direito de
recompensa e mais R$ 150 mil de indenização por danos morais.
O Escritório Coelho e Franco Advogadas Associadas, que
representa o motorista na ação, informou que analisou detalhadamente o caso e
tem plena convicção de que ele se enquadra no direito à recompensa previsto em
lei e que levou a questão ao judiciário para reconhecer o direito à recompensa
no mundo digital, já que a devolução ocorreu de forma voluntária. Também
destacou que a quantia não pertencia a terceiros, mas sim à instituição (veja
nota na íntegra no fim da reportagem).
O dinheiro foi devolvido e o saldo da conta de Antônio voltou
ao normal na época, contendo os R$ 227 que ele tinha antes de toda a confusão.
Apesar de o problema ter se resolvido para o banco
responsável pelo erro, Antônio enfrentou diversos problemas mesmo tendo agido
com honestidade. Segundo ação inicial movida contra o Bradesco, a defesa do
motorista alega que ele sofreu pressão psicológica por parte do gerente da
agência para que o dinheiro fosse devolvido, mesmo que isso tenha partido do
próprio Antônio.
"[...] Imediatamente, comunicou o Banco do Bradesco
sobre o erro, informando que devolveria os valores no dia seguinte devido ao
horário de funcionamento das agências. O gerente do Banco Réu iniciou uma
pressão psicológica sobre o Autor, insinuando a presença de “pessoas” na porta
de sua casa para aguardar a devolução do valor, tratando o Autor como um
criminoso", destacou os advogados do motorista em trecho do documento que
está tramitando na 6ª Vara Cível de Palmas.
A situação, segundo a defesa, gerou 'abalos emocionais e
constrangimentos' a Antônio durante a resolução do problema. Além disso, a
grande proporção midiática que o caso alcançou levou à 'especulações e
exposição de sua vida íntima', do motorista e da família dele.
Outro ponto levantado pelos advogados que assinam a peça inicial do processo contra o Bradesco é que como o banco fez a transferência para a conta do motorista em outra instituição, ele teve uma tarifa bancária aumentada automaticamente, sem nenhum aviso prévio.
Homem recebeu quase R$ 132 milhões por engano — Foto: TV Anhanguera/Reprodução |
Direito a recompensa
Pela devolução da transferência milionária após atitude de
honestidade, a defesa alega que Antônio tem direito ao percentual de de 10% do
valor que foi encontrado em sua conta bancária e devolvido.
O pedido é baseado no artigo 1.234 do Código
Civil, que determina que em caso de restituição de coisa achada, a pessoa
tem direito a uma recompensa não inferior a 5% do montante. Nesse sentido, o
valor pedido ultrapassa R$ 13 milhões.
"O Autor encontrou, em meio virtual, um valor que não
lhe pertencia e prontamente tomou medidas voluntárias para devolvê-lo,
demonstrando integridade e boa-fé de modo que faz jus a aplicação de uma
recompensa proporcional ao esforço e à honestidade demonstrada pelo
devolvedor", destacaram os advogados na ação.
Já a indenização por danos morais diz respeito às
consequências emocionais causadas ao motorista desde que descobriu a quantia
milionária em sua conta, já que ele ficou "extremamente assustado e
preocupado com as possíveis consequências da apropriação involuntária de um
valor tão alto".
"Esse episódio gerou um trauma considerável, pois o
Autor, uma pessoa simples, religiosa e avessa a exposições públicas, passou a
temer pela sua segurança e a de sua família", diz trecho da ação.
Por mais essa falha do banco, o pedido é no valor de R$ 150
mil por danos morais.
O caso corre na Justiça desde julho de 2024 e está marcada
para o dia 18 de fevereiro deste ano uma audiência de conciliação entre as
partes, por meio de sistema de videoconferência.
Relembre o caso
Antônio Pereira do Nascimento é pai de quatro filhos e avô de
14 netos. Assim que percebeu que tinha a quantia na sua conta não pensou duas
vezes: entrou em contato com o banco para devolver o dinheiro.
“Nunca vi um dinheiro desse na minha vida e não consigo nunca
na minha vida, só se ganhar na mega sena, e jogar eu não jogo. Então é
difícil”, disse Antônio na época.
Apesar da boa ação, ele conta que chegou a ter R$ 70 reais
descontados da sua conta por causa da cobrança de uma taxa indevida.
"A gente que é honesto no Brasil, a gente paga para ser
honesto. Eu fiz foi pagar. Gastei petróleo, andei no meu carro, saí de minha
casa, perdi meu dia de serviço. Eu vi que tinham descontado R$ 70 da minha
conta, porque me colocaram no 'VIP'. Aí eu disse para eles: 'Que vip? Eu não
quero vip não. O dinheiro não era meu, eu não vim devolver para vocês? Vocês
fizeram foi me botar na tarifa mais cara. Pago uma taxa de R$ 36 vou pagar uma
de R$70?' Para mim não compensa não. Vip seria se eu tivesse muito dinheiro na
conta", explicou o motorista após o susto do valor milionário e as
consequências do erro da instituição.
Íntegra da defesa do motorista:
O Escritório Coelho e Franco Advogadas Associadas, ao ser
procurado pelo Sr. Antônio, analisou detalhadamente o caso e tem plena
convicção de que ele se enquadra no direito à recompensa previsto no Código
Civil.
O Sr. Antônio recebeu, de forma equivocada, valores em sua
conta por um erro do banco. No entanto, não foi a instituição financeira quem
identificou o equívoco, mas sim o próprio Sr. Antônio, que, de maneira
espontânea e honesta, notificou o banco sobre o ocorrido.
É fundamental destacar que os valores recebidos indevidamente
não pertenciam a terceiros, sejam pessoas físicas ou jurídicas, mas sim ao
próprio banco. Não há como afirmar se a instituição teria identificado o erro
ou em que momento isso ocorreria.
Além de ter agido com total transparência ao informar o banco
e providenciar a devolução dos valores, o Sr. Antônio foi tratado de forma
ríspida pela instituição e coagido a comparecer imediatamente à agência para
desfazer a transação. Além disso, sua privacidade foi invadida por meio de
contatos insistentes por diversos canais de comunicação.
Diante desse cenário, estamos levando a questão ao
Judiciário, para reconhecer o direito à recompensa no mundo digital,
especialmente nos casos em que a devolução de valores indevidos parte, de forma
voluntária, de quem os recebeu.
O direito precisa acompanhar a evolução dos tempos, e o nosso
Escritório está empenhado em garantir que esse importante precedente seja
firmado, assegurando o reconhecimento da boa-fé e da honestidade no ambiente
digital.
Fonte: g1